26 de maio de 2011

As Bumas de Avalon: a lenda do Rei Artur pela visão feminina


Quando se trata de uma história de reis e seus reinados, de heroísmo, de cavaleiros e espadas, não se espera que as luzes da ribalta estejam sobre protagonistas femininas. Mas Marion Zimmer Bradley é tão exímia em escrever sobre a figura feminina, seu papel na sociedade e suas dores, anseios e desejos, quanto sobre o tema medieval.
Assim, enquanto a lenda conta de Artur e de sua jornada ao trono da Bretanha, sob orientação de Merlin e pelo poder da espada Excalibur, de sua queda pelas mãos do próprio filho e por intermédio da bruxa Morgana, em As Brumas de Avalon contemplamos os bastidores dos acontecimentos que levaram o rei ao poder.
Tudo acontece por desígnio de Viviane, a Senhora do Lago. Representante da Fé Antiga, anterior ao aparecimento do cristianismo naquela terra, Viviane vê a Ilha Sagrada de Avalon ser engolfada pelas brumas e lançada a um espaço paralelo ao mesmo passo em que a religião da Deusa é obscurecida e demonizada pelos sacerdotes de Cristo.
A Bretanha era, então, uma terra romanizada, e os nobres e poderosos que guardavam e dirigiam a sociedade seguiam os valores cristãos, embora convivessem lado a lado com os ritos e superstições de cunho pagão, mas que eram progressivamente abandonados através da influência do clero. Os druidas e sacerdotisas da Deusa precisavam adotar a postura necessária para resgatar a Fé Antiga e impedir que Avalon e os demais lugares sagrados fossem separados do mundo ao redor, junto com toda magia e conhecimento advindos da Deusa e da natureza.
Mas tanto a religião dos antigos quanto a dos cristãos eram igualmente ameaçadas pelos bárbaros e saxões contra os quais a Bretanha estava em guerra desde que as tropas romanas a abandonaram para retornar à sua capital, deixando para trás uma cultura semi-estruturada e fronteiras sob constante ataque invasor.
Viviane encontrava no advento do líder militar Uther Pendragon ao trono o momento ideal para traçar uma aliança com o futuro Grande Rei, tramando para que sua própria irmã, Igraine, desse a ele um herdeiro à coroa, um homem que nasceria para governar e trazer paz e perseverança à Bretanha, um rei de territórios cristãos mas nascido e criado da magia de Avalon: Artur Pendragon. Mas até que o enlace de Igraine com Uther fosse levado a cabo, até que o futuro Grande Rei fosse gerado e posto no trono, Viviane teria de usar muito de suas habilidades e enfrentar muitos desafios, dentre os quais, manipular o destino e a vontade de suas próprias irmãs, filhos e sobrinhos.
Em As Brumas de Avalon, Morgana das Fadas é descaracterizada daquela mesma personagem da lenda popular, a inimiga de Artur e Merlin, a bruxa devassa e ardilosa que trama contra a paz do reino. Agora, ela mostrada como uma sacerdotisa de Avalon, uma mulher negligenciada na infância, que é trazida à Ilha Sagrada para ser disciplinada no serviço à Deusa e aprender a desenvolver a Visão. Seu papel na trama torna-a a protagonista da saga, e sua personalidade resignada, por vezes sofrida, e o encanto de sua sutil magia elegem-na uma personagem muito interessante e querida.
E é pelo dom de Marion Zimmer Bradley em criar uma narrativa medieval palpável, somada ao tema arturiano, que As Brumas de Avalon merece a fama que alcançou e o patamar de literatura auto-recomendada. Inexplicável a forma como a estória seduz enquanto se desenrola na roca de fiar, na soleira da lareira, na barra das anáguas e nos grandes salões de pedra, onde ladies, rainhas e sacerdotisas resolvem e influenciam o destino de toda uma nação.
Não é de agora minha relação com a autora. Sua série de livros sobre o planeta Darkover influenciou grandemente minha cultura literária e, por que não, minha formação pessoal. Com eles (o primeiro foi A Espada Encantada), aprendi, já cedo, que as pessoas são ambíguas, à vezes boas e ao mesmo tempo más. Além de que, são, acima de tudo, muito libidinosas. Talvez por causa de Marion Zimmer Bradley, meu gosto literário seja ainda hoje tão voltado para a fantasia, para os dramas psicológicos e, sempre que possível, para temas eróticos.

Um comentário:

  1. Li essa séria quando era adolescente, pegando de biblioteca. Acredito que sejam os livros dos quais mais gostei na vida.
    Hoje tenho a coleção completa, mas nunca reli. Tenho medo de mudar aquelas lembranças tão românticas (apaixonada pelo Artur). E se agora eu não gostar tanto dele? Não posso me decepcionar... rsrsrs

    Gisela (do skoob)

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